SUSAN ALCORN
Susan Alcorn (E.U.A., 1953) tem um trajecto raro para alguém que, como ela, tenta continuamente transcender as fronteiras da expressão sonora e do léxico musical. Começando por tocar guitarra slide, aquando de um encontro fortuito no início da sua carreira com Muddy Waters, que lhe indicou o instrumento como sendo o adequado para os seus intuitos da época, ía igualmente dividindo o seu tempo no dobro, influenciada por mestres como Josh Graves ou Tut Taylor.
Aos 21 anos toma a decisão de pegar na guitarra pedal steel, um instrumento principalmente conotado com a música country & western em que estava imersa. É nesse universo que se mantém concentrada durante largos anos, como uma cotadíssima música de acompanhamento, onde aprende milhares de temas do cancioneiro sulista norte-americano. Paralelamente, começa um estudo sério de formas extraordinariamente diferentes, dedicando-se a Roberta Flack, Mercedes Sosa, Penderecki, Messiaen, John Coltrane e Ornette Coleman, figuras que começaram a permear-se no seu vocabulário.
É em correspondência com o pianista Paul Bley no final dos anos 1980 que o seu trabalho solista começa a desenhar-se nas formas que conhecemos hoje, quando Bley sugere a Alcorn que esse seria o momento em que devia começar a processar e aglutinar toda essa informação estética, e a desenvolver um discurso próprio concordante com a aprendizagem que vinha fazendo.
Estará precisamente aí uma das virtudes preciosas de Susan Alcorn, que a separam - com a excepção dos músicos provenientes do jazz – da vasta maioria dos criativos que habitam as regiões da improvisação, bem como da composição mais livre e longínqua de trâmites académicos. É a abrangência da cultura, técnica e abertura estrutural e lexical de Alcorn, que conhece como poucos a história cada vez mais insular da country, e que se estende até à música contínua de Pauline Oliveros (com quem permanece filiada), ao jazz existencialmente mais ambicioso (colaborou com Joe McPhee, Joe Giardullo, Peter Kowald), à música gamelã, à canção libertária sul e centro-americana, à composição contemporânea e inclusivamente à história da própria improvisação (trabalhou com Lê Quan Ninh, Thurston Moore ou Fred Frith).
Após várias décadas a residir em Houston, mudou-se em 2007 para a cidade de Baltimore, no estado de Marylan. Foi precisamente nesse ano que seu deu a edição do seu mais recente trabalho a solo, And I Await... The Resurrection of the Pedal Steel Guitar (Olde English Spelling Bee). Um tratado essencial das possibilidades discursivas, tonais, texturais, espaciais e anímicas de um instrumento que tem vivido uma existência afastado do desafio estético e da experimentação, mas que através do trabalho extremamente rico e delicado de Alcorn nos dá conta do quão tem sido desperdiçado, e do quão magnífico consegue ser.
myspace http://www.myspace.com/susanalcorn
video em casa http://www.youtube.com/watch?v=C9NAPHpUV-4
vídeo ao vivo, Zebulon, NY http://www.youtube.com/watch?v=miiZyUaj_NA
MICHAEL HURLEY + SUSAN ALCORN & MANUEL MOTA
Cantor, guitarrista, cartoonista da festa estranha de estar vivo e vagabundo por necessidade existencial, Michael Hurley tem uma história enquanto músico que remonta ao início dos anos 60. Aí, um jovem de olhos a brilhar e vida vagamente desvairada, nos anos mágicos da Greenwich Village de Nova Iorque onde as artes e a boémia eram economicamente comportáveis aos criativos que para lá migravam com a maior pressa, e onde despontaram das mentes de olhar simultaneamente mais auspicioso e crítico da época, assinava o disco de estreia ‘First Songs’ pela Folkways, casa principal da canção de luta norte-americana, em que nem Bob Dylan foi aceite.
É estranho olhar para a sua discografia e repararmos que até ao segundo disco, o clássico ‘Armchair Boogie’, de 1971, passaram seis anos, mas talvez seja importante começar por aí para que se compreenda um pouco daquilo que Hurley é, aquilo que representa, e porque importa. Como os mais quarenta anos de carreira podem atestar, a funcionalidade da sua existência nunca passou a não ser por todas as coisas em que Hurley poderia agarrar, amar, tocar ou sentir, no momento que separa o agora do fim da noite. Mais do que se preocupar com contratos, digressões, entrevistas ou promoção, entendeu viver perto do amor, da intensidade do real quando este se dirige à eternidade, e do abalo contínuo, abismal, da procura da clarificação da verdade dos dias, das coisas, das profundezas da nossa alma.
Se eticamente parece uma decisão perfeitamente lógica e normal, na prática são poucos os que a tomam. Os artistas, teoricamente aqueles que, entre várias outras opções, poderiam revelar e questionar a contemporaneidade em todas as suas camadas, em todas as suas vertentes, esquivam-se sucessivamente de o fazer. É neste sentido que Michael Hurley será hoje, tanto como em qualquer outra altura (mas talvez agora mais do que nunca, porque agora será sempre mais importante que outro momento), uma inspiração tremenda e um farol para como termos menos por deslindar de dentro de nós, para podermos ser mais claros uns para os outros, para que exista menos táctica na forma como comunicamos.
Michael Hurley parece fazer a sua vida de uma forma que lhe permita contar a sua história com inteireza e transparência absolutas. Que a temática de muitas das suas músicas seja a solidão e a angústia da precariedade do entendimento, tanto quanto é a balbúrdia de um efusivo serão de copos entre amigos e amantes, é sintomático de tudo isto. A arte, agora mais do que nunca – e isto não deve ser entendido como a apologia de qualquer tipo de virtuosismo -, precisa louvar os heróis que vivem pela verdade dos gestos, porque apenas tocam, cantam e uivam aquilo que realmente são e realmente conhecem.
A um ano de completar 70 primaveras, Michael Hurley é prova viva desta missão que não o é, mas que nos surge como um trajecto estóico de retaliação natural, sem esforço, porque se limita a viver perante as suas regras benignas.
Os Rolling Stones decretaram que o seu álbum com os Unholy Modal Rounders, ‘Have Moicy’, foi um dos que marcaram definitivamente os anos 70. Foi e é influência determinante algumas das figuras mais importantes da canção anglo-saxónica de anos recentes, como são os casos de Cat Power (que ajudou a divulgar o seu nome nos anos 90, com versões fantásticas para clássicos de Hurley como “Troubled Waters”, “Sweedeedee” ou “Werewolf”) ou Devendra Banhart (que editou o seu maravilhoso album de 2007, ‘Ancestral Swamp’). É dos raríssimos artistas que se mantém coerentes ao longo de décadas, e que reflectem, com a verdade na boca, uma evolução lenta e calma, de uma vida que sabe que terrenos pisa. Podem verificá-lo em qualquer ano em que houve actividade editorial, de ‘Hi-Fi Snock Uptown’, a ‘Long Journey’, até aos mais recentes ‘Ancestral Swamp’ e ‘Ida con Snock’. Não lhe conhecemos álbum que não seja precioso.
Hurley vai tocando um pouco por toda a América, desde que lhe dêm dinheiro para pagar a gasolina, um sítio para dormir e algo para comer e beber. Livrarias, auditórios ou igrejas modestas à beira de uma estrada, todos os que o contactam de boa vontade recebem na mesma moeda. Mas mais planeamento que esse parece desinteressar o passo vagaroso do homem, que se desenhou tantas vezes (vejam o belíssimo espólio de capas da sua autoria) como um lobo, que tanto sabe ser hilariante com o riso da felicidade, como encarar com preparação os mais escuros segredos da identidade sua e de um país que sempre amaldiçoou (e postumamente celebrou) quem questionou o seu ímpeto.
Depois de muitos anos a tentar, é com enorme orgulho que apresentamos no âmbito do Festival TranS_Sintra, a estreia nacional de Michael Hurley, um santo ignorado (mesma que já venha nos livros da história), numa raríssima aparição europeia.
site oficial http://www.snockonews.net/
Entrevista para PopWatch (1997) http://www.furious.com/perfect/michaelhurley.html
Snock ‘N Roll: Adventures With Michael Hurley (curta metragem) http://blip.tv/marcisraelfilms/snock-n-roll-adventures-with-michael-hurley-complete-documentary-short-1709497
Blue Navigator – publicação e site dedicados à obra de Michael Hurley http://www.bluenavigator.net/
Entrevista para State of Mind Music (2009)http://www.stateofmindmusic.com/entry/806/The-Vermonters-Wanted-Me-to-Play-Hank-Williams:-A-Conversation-with-Michael-Hurley/
Ao vivo e ao piano numa mercearia, em Portland, Oregon http://www.youtube.com/watch?v=RWAOJr5PcAI&feature=related
SUSAN ALCORN & MANUEL MOTA
Susan Alcorn (E.U.A., 1953) tem um trajecto raro para alguém que, como ela, tenta continuamente transcender as fronteiras da expressão sonora e do léxico musical.
Começando por tocar guitarra slide, aquando de um encontro fortuito no início da sua carreira com Muddy Waters, aos 21 anos toma a decisão de pegar na guitarra pedal steel, um instrumento principalmente conotado com a música country & western em que estava imersa. É nesse universo que se mantém concentrada durante largos anos, como uma cotadíssima música de acompanhamento, onde aprende milhares de temas do cancioneiro sulista norte-americano. Paralelamente, começa um estudo sério de formas extraordinariamente diferentes, dedicando-se a Roberta Flack, Mercedes Sosa, Penderecki, Messiaen, John Coltrane e Ornette Coleman, figuras que começaram a permear-se no seu vocabulário.
É em correspondência com o pianista Paul Bley no final dos anos 1980 que o seu trabalho solista começa a desenhar-se nas formas que conhecemos hoje, quando Bley sugere a Alcorn que esse seria o momento em que devia começar a processar e aglutinar toda essa informação estética, e a desenvolver um discurso próprio concordante com a aprendizagem que vinha fazendo.
Estará precisamente aí uma das virtudes preciosas de Susan Alcorn, que a separam - com a excepção dos músicos provenientes do jazz – da vasta maioria dos criativos que habitam as regiões da improvisação, bem como da composição mais livre e longínqua de trâmites académicos. É a abrangência da cultura, técnica e abertura estrutural e lexical de Alcorn, que conhece como poucos a história cada vez mais insular da country, e que se estende até à música contínua de Pauline Oliveros (com quem permanece filiada), ao jazz existencialmente mais ambicioso (colaborou com Joe McPhee, Joe Giardullo, Peter Kowald), à música gamelã,
à canção libertária sul e centro-americana, à composição contemporânea e inclusivamente à história da própria improvisação (trabalhou com Lê Quan Ninh, Thurston Moore ou Fred Frith).
Essa dimensão de humanidade e campo conceptual de Alcorn encontra eco no percurso de Manuel Mota (Portugal, 1970), celebrado músico e improvisador de guitarra eléctrica, licenciado em arquitectura e escondido artista visual (desenhos e vídeo). Com trabalho público desde 1989, o músico avança com a sua hermenêutica para a guitarra tocada em ‘fingerstyle’ em finais da década de 90, após anos de pesquisa e afecto pela música de vultos da escola minimalista norte-americana, como Phil Niblock e La Monte Young. Dá início também à sua editora Headlights, que lança a generalidade dos seus discos e dos de Sei Miguel nesse período – colaboração criativa para além de editorial, que se prolonga até meados da década passada – para além da parceria e cumplicidade com Margarida Garcia que se estende até aos dias de hoje. Em anos recentes integrou as bandas Curia e Dru, tornando-se notória a sua parceria com David Maranha, integrando formações ao vivo e em disco lideradas pelo músico lisboeta, bem como participações no colectivo Osso Exótico (com actuações no Festival Trama de 2009 ou a contribuição no LP/DVD editado pela Fundação de Serralves já neste ano). Mantém também uma crescente agenda de concertos ao vivo no nosso país, Europa e EUA, tendo recentemente feito a primeira parte do concerto dos Sonic Youth no Coliseu do Porto. Desconta que toca ‘ao calhas’, mas a sua música incólume de ruído e estática e de informação, parece trazer-nos à tona a ‘fruta estranha’, poema como só Billie Holiday o cantava.
Esta será a primeira vez que ambos tocarão juntos, numa noite que se antevê de antologia para os livres de espírito.
myspace [http://www
BILL ORCUTT
Provavelmente o mais crucial e influente dos guitarristas a trabalhar no avanço do vocabulário do blues e do rock desde o arranque da década de 90, Bill Orcutt, depois de um hiato de uma dúzia de anos, lançou no final de 2009 um documento chave para a progressão das possibilidades do instrumento.
Até agora celebrado como mestre da guitarra eléctrica, foi co-fundador, juntamente com Adris Hoyos (bateria e voz), dos Harry Pussy (1992-1997), duo (e mais tarde trio) explosivo que aglutinava o rock, ao punk hardcore, ao free jazz, a um conhecimento rico da história das margens e raízes destas músicas. A banda tomou todas estas referências atomizando-as em canções curtas e violentíssimas, que versavam uma catarse pós-atonalista de uma maneira que veio a revolucionar a história de todo o rock de preocupações estéticas contemporâneas que surgiu no seu encalço.
‘A New Way To Pay Old Debts’ (Palilalia Records, 2009) é o primeiro álbum a solo de Orcutt e a sua estreia num universo acústico. Utiliza uma guitarra que tem desde criança, que se foi partindo e sendo restaurada ao longo dos anos, a passar por um amplificador (encontrado na rua nos anos 80) e um microfone de guitarra, tomando inspiração no som de Elmore James, celebrado músico de blues eléctrico norte-americano.
Nesta transição para a acústica, prossegue empregando, tal como no seu registo anterior, apenas quatro das seis cordas tradicionalmente utilizadas na guitarra, trabalhando a sua volumetria a um ponto de hipersensibilidade do instrumento, que é tocado com o maior fogo e ímpeto, por vezes parecendo que a sua madeira vai estalando ao ponto de estar prestes a partir-se por completo.
Conjuga várias heranças de música real e crua do último século, dos delta blues de Mississipi Fred McDowell, passando por um estudo profundo de fontes aparentemente tão díspares como Derek Bailey, Glenn Gould ou Cecil Taylor, ou o flamenco de Ramon Montoya. Este cruzamento de tradições, ideias e vocabulários, permite-lhe armar um discurso que inclui uma série de elementos anteriormente encarados como contraditórios nas normas da improvisação ou da composição instantânea. Um trabalho melódico caligráfico ladeado por uma aguda noção de atonalismo, uma cadência rítmica turbinada paralela a quebras constantes em ataque percussivo do instrumento, uma capacidade clínica em fazer com que a música desapareça repentinamente, e uma noção ritualizada de narrativa e estruturação da própria escrita, de onde resulta um novo e impressionante léxico de expressão musical.
editora http://palilalia.com/
video para a Wire http://www.thewire.co.uk/articles/3135/
entrevista http://www.foxydigitalis.com/foxyd/features.php?which=449
THE STRANGE BOYS
Festa poética rock 'n' roll como nenhuma outra em tempos recentes, na forma angélica/diabólica de Ryan Sambol e a sua corte de Strange Boys - recentemente aumentada por Tim Presley ('vocals and laughs', diz no myspace) e pela carismática Jenna E. Thornhill deWitt (voz e saxofone), ex-Mika Miko (R.I.P.). Rock como filosofia de vida e tocha que ilumina este nosso deambular eterno, a música dos Strange Boys é um glorioso ensaio sobre liberdade, intensidade, a sensualidade das intricacias e o estoicismo ético por detrás do mais real dos uivos. Editaram já este ano 'Be Brave', segundo capítulo discográfico para a banda, desta vez com o carimbo histórico da Rough Trade. Criminoso é o rockeiro que falta a esta ocasião.
editora http://roughtraderecords.com/
entrevista http://www.spinner.com/2010/03/12/the-strange-boys-interview-sxsw-2010/
video http://www.youtube.com/watch?v=1hEQd-1XdIs&feature
RODRIGO AMADO MOTION TRIO
Presença constante, activa e dinamizadora no panorama de jazz nacional há mais de 20 anos, Rodrigo Amado é hoje um dos mais pertinentes improvisadores no panorama jazzístico europeu. Em anos recentes tem estado imparável com edições, datas e novos trabalhos, sendo que um dos focos tem sido este excelente Motion Trio com Miguel Mira (violoncelo) e Gabriel Ferrandini (bateria). A secção rítmica brilha, em criatividade e abertura estrutural, com uma métrica seguríssima e livre, mas sempre plena de substância e pertinência. Arquitectura idílica para o saxofone de Amado, que nesta formação prima por fogo, lucidez e placidez. Das formações mais auspiciosas do jazz português.
myspace http://www.myspace.com/rodrigoamado
site oficial http://www.rodrigoamado.com/
entrevista Jazz.pt http://www.rodrigoamado.com/InterviewJazzPt.html
OMAR SOULEYMAN
O patrão de tudo o que concerne festa, Omar Souleyman é dos nomes mais emblemáticos e exuberantes de todo o novo olhar que, graças a editoras como a Sublime Frequencies, o Ocidente passou a ter sobre a realidade que não aparecia nem em televisão, nem em lojas de discos, e na internet só em línguas que não sabemos ler. Dos cantores mais populares da Síria, proporcionou uma das grandes celebrações em música de 2009 no Anfiteatro da Fundação Gulbenkian, que dançou como nunca antes. Acabou de lançar a terceira edição fora do seu país, 'Jazeera Nights', compilação de gravações incríveis em casamentos de 1995 a 2009, lembrete precioso de que o potencial que temos para nos entendermos todos é realmente altíssimo, se toda a gente estiver a fim. Impossível não amar - se não conhecem garantimos que bastam uns segundos de música para ficarem convertidos.
Fica a tradução para a letra imperdível de "Li Raja Behawakom": "I like you, girl / You're as important as air or water for my heart / She laughed at me with her eyes / And she's got a Romanian look / There's no news from you, but I'm used to it / I'm thirsty to see you / Seeing your eyes makes me live in dishonor".
editora http://www.sublimefrequencies.com/
entrevista http://thequietus.com/articles/01735-syrian-soul-man-omar-souleyman-interviewed
perfil no The Guardian http://www.guardian.co.uk/music/2009/jun/05/oma-souleyman-syrian-music
perfil no El Mundo http://www.elmundo.es/elmundo/2009/08/31/orienteproximo/1251712163.html
video para ‘Leh Jani’ http://www.youtube.com/watch?v=pgRUHIeaKOk&feature
HYPE WILLIAMS
Estreia nacional para um trio que se divide entre Londres e Nova Iorque, e cujo crescimento temos vindo a assistir com fascínio e reverência. Os instrumentais, pormenores da inclinação estética, algumas métricas e desarmonias lembram minimamente uns Excepter mais doces (se ‘KA’ não fosse tão apocalíptico), mas tudo o resto é navegação pioneira. A batida é universal-world contemporânea, os graves descendentes da globalização do tuning, o groove progressão auspiciosa para o amanhã, as melodias (voz e electrónica) arquitectadas por olhos a brilhar para o desconhecido. Tanta originalidade no mesmo sítio é sempre sinal de grandeza. Oportunidade preciosa para a testemunhar no seu arranque. 2/5 da Filho Único estão nos pratos antes e depois do concerto, até às 4 da manhã.
myspace http://www.myspace.com/hypheewilliams
3 canções http://www.pinglewood.com/pinglewood/2009/03/321-hype-williams/
Hounds of Hate mixtape http://www.pinglewood.com/NME/2009/JULY/II_III_B_featHoundsOfHate.mp3
video "Rescue Dawn" http://www.youtube.com/watch?v=NupR1k7QZdE
video ‘Untitled’ feat. Yung Goatmen http://www.youtube.com/watch?v=rxaKkEcmJAo9
TIGRALA
Trio que acaba de editar o seu primeiro e homónimo album pela Mbari, onde a guitarra revolucionária de Norberto Lobo (aqui principalmente concentrado em tambura), o novo estado acústico do Guilherme Canhão (depois dos cometas feéricos dos Lobster), e o delírio vibrafonista de Ian Carlo Mendoza (que anda também a explorar percussões latinas várias, e todos os outros objectos - todos são possibilidades - onde a música existe), numa unificação muito rara.
Estão por aqui traços dos Tortoise de 'TNT' e de um Steve Reich de arraial metafísico, um teluricismo lusitano que compreende e transcende as coordenadas que Giacometti e associados nos deixaram. Um continuar das tradições tribais como aglutinadas por Don Cherry (e aqui redireccionadas para linguagem própria pelos Tigrala), mas acima de tudo, como em qualquer outra circunstância que envolva qualquer um destes músicos, o cerne vital desta coisa que aqui temos perante nós está noutro sítio, mais acima destas histórias de escrever. Está no maior dos amores pela música, no milhão de feixes de luz do encaixe milagroso que só existe nas circunstâncias mais empáticas de som e partilha - a alegria pura destes três homens que há pouco deixaram de ser miúdos, em desbravar estradas de melodia, ritmo e todos os transes, milagres e asceses que daí advém.
O nosso 'Art Ensemble de Mirandela' como nos disse um amigo há tempos, numa - aqui é mesmo - celebração para nos deixar com danças novas para todos os dias que daqui em diante nos surgirem pela frente.
Este será o concerto oficial de apresentação em Lisboa de ‘Tigrala’.
myspace http://www.myspace.com/tigrala
editora http://mbarimusica.blogspot.pt/
video ao vivo http://www.youtube.com/watch?v=5UXltFX76gU&feature
ZUL ZELUB – JORGE LIMA BARRETO & JONAS RUNA
Figura incontornável da música portuguesa nas últimas décadas, Jorge Lima Barreto é musicólogo, ensaísta, co-fundador da Anar Band (com Rui Reininho) e dos Telectu (com Vítor Rua). Prossegue trilhando um caminho extremamente idiossincrático, que reúne conhecimento proveniente das mais variadas áreas de criação musical e artística, da composição moderna e contemporânea, ao jazz, ao minimalismo ou ao rock. Nesta actuação irá apresentar-se em piano eléctrico na companhia de Jonas Ruma, em ‘computer music & kima x’, constituindo assim o projecto Zul Zelub que partilham desde 2007.
Crítica a ‘Zul Zelub’, disco a solo de 2008 na Clean Feed http://www.jazzloft.com/p-47956-zul-zelub.aspx
Curriculum na Meloteca http://www.meloteca.com/catalogo-lima-barreto.htm
CIAN NUGENT
Músico irlandês extremamente promissor e com um trabalho já radiante, Cian Nugent é um herdeiro directo da escola norte-americana de fingerpicking em guitarra acústica, entretanto universalizada, que liga John Fahey, a Leo Kottke, a Jack Rose – com todas as suas orientalizações, africanizações e metaformoses culturais. Cian trabalha principalmente em formas longas, em lentos, intricados e hipnóticos arcos mântricos, revelando melodias descarnadas do centro do turbilhão harmónico e rítmico que vai desenhando. Está neste momento próximo de terminar o seu próximo álbum, que tudo leva a crer deverá ter edição ainda em 2010.
myspace http://www.myspace.com/ciannugent
Vídeo ao vivo em Dublin http://www.youtube.com/watch?v=gBknvK1G2wQ
Vídeo ao vivo em Limerick http://www.youtube.com/watch?v=xgZI8M7WAXg&feature
JP SIMÕES
Nascido em Coimbra, em 1970, ‘JêPê’ passou parte da infância e adolescência no Brasil, diáspora que o formou autoralmente numa dieta de João Gilberto, Caetano Veloso e Chico Buarque. Em meados da década de 90 ingressa nos Pop dell’Arte, ajudando a concretizar o disco ‘Sex Symbol’ com o seu trabalho de guitarra. Volta a Coimbra pouco depois para congeminar a banda que mudaria o cenário pop rock nacional dos finais de 90, os extintos Belle Chase Hotel. Ao longo de dois álbuns, e cerca de 7 anos de estrada, excitam mentes pensantes nas multidões anónimas de Queimas e Festivais de Verão, deixando-as viciadas para de então para a frente segui-lo com atenção e carinho no seu percurso individual de maturação criativa e emocional de um artista total. Seguiu-se a aventura do Quinteto Tati, com um ‘Exílio’ celebrado pela crítica pela sua amplitude de ritmos e latitudes de salão e, finalmente, a carreira a solo, com início discográfico em ‘1970’, de 2007, que chega a atingir o 12º lugar do top de 30 discos mais vendidos de Portugal e o imprime definitivamente no consciente colectivo da Nação como um escritor e intérprete de canções incontornável.
Actualmente encontra-se a ultimar a produção do novo disco ‘Onde mora o mundo?’, com data prevista de edição para Outubro, esperando-se tomar contacto com as novas canções e o que sobre nós dirão, no Jardim de Esculturas do Museu do Chiado.
myspace http://www.myspace.com/fabulabebada
vídeo ao vivo na Livraria Trama http://www.youtube.com/watch?v=L36ZpH1LLYQ
vídeo para o Expresso sobre a apresentação de ‘Boato’ no S Luiz http://www.youtube.com/watch?v=zUEFCUo-B2U&feature
entrevista ao jornal i http://www1.ionline.pt/conteudo/11327-jp-simoes-sou-tao-mau-como-antes-mas-com-mais-visibilidade
KIMI DJABATÉ SOLO
Um dos segredos mais bem guardados e estimados de Lisboa desde o início da década passada, todos os que se entregavam generosamente à alegria e à dança ao som da sua música ao vivo sabiam que não ia durar para sempre tal tesouro permanecer escondido do resto do globo. Descendente de uma família secular de músicos mandingas, Kimi viveu toda a sua vida imerso em som e cultura, fosse aprendendo balafon (instrumento em que é virtuoso), tocando guitarra ou cantando. Ao seu segundo álbum no ocidente, ‘Karam’ (editado pela multinacional Cumbancha, e o primeiro com real distribuição internacional), Kimi Djabaté foi mundialmente aplaudido, tendo o álbum inclusivamente sido considerado como o 2º melhor na categoria world pela BBC. Um verdadeiro príncipe africano, que faz o Bairro Alto e Lisboa brilharem mais forte, aqui numa actuação a solo para nos dar mais coração e suavidade neste fim de tarde na capital.
myspace http://www.myspace.com/kimidjabate
video http://www.youtube.com/watch?v=LDKuaTmSLjc&feature
entrevista no ípsilon http://ipsilon.publico.pt/musica/entrevista.aspx?id=245588
entrevista no cotonete http://cotonete.clix.pt/noticias/body.aspx?id=43913
B FACHADA
“Regras têm que ver com lógicas. As minhas canções têm que ver com falta de lógica. Uso essa sobreposição quer para efeitos cómicos, quer para efeitos de auto-ironia. Se estou com tendências moralistas, quando isso passa para a canção é como se essa moral fosse ridícula – uma como as outras”.
Há dois anos ninguém lhe sabia o nome, mas B Fachada, (Queluz, 1984), já se torna claro para muita gente (mesmo que não unânime – como sempre, com os grandes) que é o maior escritor de canções português da sua geração. Desde João Peste ou Variações que não havia esta vibrância e frescura que só quem canta com a verdade na voz consegue comunicar, ainda mais potente pelo deserto temporal e artístico que separa a década de 80 a 2010 neste campo de actividade artística. O seu poder resulta, acima de tudo, como nos maiores da história da canção Ocidental moderna e contemporânea, de uma leitura de crítica e lucidez de ímpeto inquebrantável. Bernardo Fachada diz-nos que “há o cuidado de não substituir uma convenção por outra. Destruir sem fazer, sem ser moralista”. Aprendeu-o com a arte pop. “Basta documentar as convenções que elas fazem o trabalho por si (…), como se fosse um mundo sem cura”. Entende que o mesmo aconteceu com os surrealistas e os modernistas, a que ciclicamente seguem sempre “os gajos que só querem sobreviver”. Será este o tempo de uma reacção colectiva na nossa terra?
Esta visão incisiva das coisas só é possível aos intertextuais, e o percurso de aprendizagens do Bernardo é de facto raro e precoce a uma série de níveis. Cresceu com a música que o pai trazia para casa. Lembra 1985 como o ano em que lhe chegaram montanhas de discos vindos do Brasil, e que com eles trouxeram a educação musical da sua infância. Apanhar com Toquinho, Paralamas do Sucesso, Tom Waits, Leo Jaime, Gentle Giant, Nina Simone ou os Specials como dieta auditiva aos 4-5 anos tinha que dar mossa benigna. Convenhamos que não é habitual que um rapaz que aos 9 anos (!) já sentisse que começava a ter noções de evolução das formas e do contemporâneo. Após esse processo, foi com os CDs de Cohen, Dylan, ‘Graceland’ de Simon & Garfunkel e os Talking Heads que foi levado até à pós-puberdade, época em que, com ‘Os Entre e os Contraentes’ de Alberto Pimenta, mais tarde o professor mais marcante que teve, começou, como diz, “a ler a sério”.
Esta educação rodeada pelas artes foi acompanhada por um percurso de estudo de 12 anos em formação musical e vários instrumentos, que arranca no violino, passa para o piano, acabando no final da sua adolescência no Hot Clube, aos 18. Nunca teve a embaraçosa banda de covers, e passou directamente para os ensaios de originais de garagem. Diz: “comecei a fazer objectos com forma de músicas”, “piadas privadas de grupo que começaram a ficar universais”, gradualmente, algum tempo após ter começado a estudar e tocar bossa nova. Mas a revelação de que ia ser músico, que “não é profissão de sonho, mas sim a que [lhe] calhou”, só acontece quando “encontra o som”, o seu – o único que importa, claro. Conseguiu, inesperadamente, aglutinar “o destino e feitio, questões emocionais e sociais, que coincidiram todas numa só actividade”.
O brio e rasgo de B Fachada, fácil de ouvir para o cidadão treinado, vem da forma como se relaciona de maneira pensada e vivida com o idioma. A sua ligação e interacção com Portugal “vem através da língua, que me obriga a trabalhar a sua estrutura (...), sendo que o trabalho parte de estudar a métrica, cagar redondilhas, etc.” Da música portuguesa com que cresceu, de Zeca Afonso, aos Mler Ife Dada até aos Pop Dell’ Arte, tem noção que atravessou uma época em que houve uma quebra grande na pertinência da produção nacional que surgiu no entretanto, sendo que também “não tinha havido nada de especial antes”. Diz que pensa “muito sobre limites”, questionando-se da existência de uma praga, que convenhamos é secular e nacional, do porquê de haver “culturas que parecem produzir gajos que encaramos como sendo de um nível inacessível”. A persistência em perseguir por um lugar no nosso quintal nunca foi um objectivo, e a conclusão que tiramos é que só lhe terá dado mais fome de existir, desta maneira que agora lhe ouvimos. Acha que devíamos ter 50% de músicas portuguesas a passar na rádio, e não 5%, sendo que ao mesmo tempo não encara de todo esta questão como uma de quotas, mas sim de qualidade – uma qualidade “não individual mas colectiva”, que cá, devido à quase completa ausência de massa critica, é trabalhada de forma “ridícula”.
A obra de B Fachada, que já tem várias coisas notáveis, e um potencial assustador de bom, vive destas leituras e de uma critica, que faltava à canção nacional, que permanece das maneiras mais vitais, naturais e poderosas de comunicação. Que quase tenhamos esquecido esta função da música em Portugal, é só mais uma razão para a pertinência do seu trabalho. O diálogo entre Bernardo e o universo é tão mais claro quando nos surpreende, ao lhe perguntarmos pelas virtudes plásticas e matéricas da forma como lida com o seu som, instrumentação (pela qual é responsável a quase 100% nos seus discos até hoje) e produção. Fala que o seu jeito de operar as coisas “tem que ver com Debussy e os impressionistas”, com a tentativa de “transpor a mancha [de Monet, e tantos outros] para a música”. “Gajos que viviam para o ofício [a seguir ao século XIX] (...) de uma forma mais descomprometida, experimental”, que tinham “o vício e não o cânone de ser sério, inundando o ofício com o real e o mundano”.
Acaba de lançar ‘Há Festa na Moradia’ (actualização de ‘Há Festa na Mouraria’, de Alfredo Marceneiro, um dos seus mestres), primeiro disponível em MP3 de forma gratuita e com alta qualidade no site da Mbari, a editora com quem trabalha agora, entretanto publicado também num exuberante vinil amarelo de 10 polegadas. O seu disco de Verão para 2010, é o álbum mais celebratório e de sátira social até hoje – um evento auspicioso, de língua afiada e humor tão acessível quanto refinado, em direcção ao diálogo mais incisivo e transparente. Ouvimos técnicas de produção e gestão de som da música angolana eléctrica pré-25 de Abril, o tratamento português ao Zeca pós-Animal Collective, um fado que se ensinou a ser de hoje, e camadas e camadas de instrumentos e vozes, arquitectadas de forma real, crua e por polir – com estúdio mas sem ter nada de asséptico. E as letras, claro, brilhantes, relatam de forma humana e contemporânea, o que é viver na Lisboa e no Portugal de hoje, com seriedade e com coração. Afinal, B Fachada mede “as consequências” da sua música “a nível e impacto pessoal. Tenho feito os possíveis por fazer coisas que me façam comover”.
“Ser moralista da forma; ter ausência de lógica no conteúdo”. “É uma posição de observar a estrutura das coisas”. B Fachada trabalha, devemos dar graças, para nos expor a uma realidade cujos factos deixámos que se escondessem. Estamos certos que a verdade, daqui em diante, só ficará maior para todos nós, enquanto lhe formos escutando a canção.
myspace http://www.myspace.com/bfachada
editora http://www.mbarimusica.com/
video "Joana Transmontana" https://vimeo.com/14655381
video http://www.youtube.com/watch?v=oAj75wICDqs&feature
ODDSAC
ODDSAC é um filme experimental de matriz e propósitos psicadélicos concebido e realizado em estreita colaboração e sinergia criativa pelos Animal Collective (música) e Danny Perez (imagem).
A sua produção estendeu-se ao longo de quatro anos, em períodos de intervalo da banda entre discos, sucessivas tours e ascenção a um estatuto ímpar e celebrado de estetas pop contemporâneos. O filme - ou álbum visual, como preferiram classificar a obra - teve a sua ante-estreia mundial no Festival de Sundance deste ano.
Seguiram-se desde então exibições um pouco por todo o mundo para dar resposta à expectativa criada em torno do resultado final do objecto.
site oficial http://www.oddsac.com/
trailer http://www.youtube.com/watch?v=2H48VtETngA
TG + él-g
Na nossa primeira sessão mensal no Lounge da rentrée, recebemos dois concertos de dois ardilosos inventores sónicos franceses, TG e él-g.
Laurent Gérard, o homem por detrás de ‘él-g’, tem vindo a consolidar ao longo dos últimos 6 anos uma meritória carreira em nome próprio a partir de Paris, com um trabalho confluente de diversos compadrios de música independente norte-americana e europeia. Congeminada essencialmente a partir de bases electrónicas, a sua música partilha ao mundo o seu fascínio por desígnios de arquitectura de torch songs em modo alucinação mediada pelo floclore ácido, musique concrète de quarto e humor chauvinista de salão em cima de palco, que são a etapa final que personaliza o seu trabalho, em disco (como o LP "Tout ploie" na Kraak e SS Records ou o 7’’ "Armelle" na Vilain chien) e ao vivo. Em 2008 formou a banda Reines d’Angleterre, com Ghédalia Tazartès e Jo, um território do domínio da ópera formato cigano prenha em preces excêntricas e invocações étnicas imaginadas, hasteadas por electrónica abstracta, que tocou ao vivo desde então em espaços criteriosos pela Europa e teve o seu primeiro, e único disco até à data, editado pela Bo Weavil.
TG, máscara de Thibault Gondard para a sua actividade de produtor de música tecnóide urbana, alicerça os seus temas e concertos ao vivo em maquinaria artesanal por si desenvolvida, que ganha uma projecção ao vivo poderosa de tão minimal e repetitiva. Com uma fronha e gánfias dignas de um mano do breakcore francês, é refrescante tomar contacto com a sua música tão criteriosa e antagonicamente desenhada, com um tom e calor digno de perspectivas realistas para o seu empenho variável no seu percurso até ao momento, mas comprometido com uma ideia de undreground francês sustentável e aberto ao diálogo europeu.
video ao vivo http://www.youtube.com/watch?v=CVqjsun6H2I
site oficial http://tg.fr.pagesperso-orange.fr/
video http://www.youtube.com/watch?v=YRfB75IKM1E
ALEXANDER VON SCHLIPPENBACH
Pedra basilar do movimento europeu do free-jazz, Alex Von Schlippenbach é um dos mais conceituados pianistas a nível mundial. Nascido na Alemanha em 1938, conta já com uma extensíssima obra enquanto compositor e improvisador em formações tão memoráveis como o Alex Von Schlippenbach Trio ou a Globe Unity Orchestra. Contando sempre com a colaboração de alguns dos nomes mais lendários de todo o jazz como Evan Parker, Tony Oxley ou William Breuker, é uma das figuras transversais às maiores movimentações de vanguarda dentro do género e à história da música no séc. XX.
site oficial http://www.avschlippenbach.com/
NORBERTO LOBO
Herdeiro da tradição de guitarristas “de mil dedos” como John Fahey ou Sandy Bull, o português Norberto Lobo tem vindo a ter um reconhecimento cada vez mais amplo e efectivo, em consonância com a sua maturação. Sem nunca se limitar à mera revisão de fórmulas e tradições, traça um percurso que o leva até ao inclassificável universo de Carlos Paredes, profetizando uma linguagem única de portugalidade, permeável a influências dos mais diversos locais, num fenómeno de aculturação e lirismo sem paralelo contemporâneo. O concerto é antecedido pela projecção do filme ‘Alan Lomax: American Patchworks 1: The Land where the blues began’.
bandcamp http://norbertolobo.bandcamp.com/
NOËL AKCHOTÉ
Guitarrista, sonoplasta, editor e jornalista incontornável da última década e meia, Noël Akchoté tem criado, com discrição mediática mas com o brilho nos olhos de quem procura e encontra novo, dos percursos mais interessantes do seu instrumento em tempos recentes. Trabalhou com Derek Bailey, Luc Ferrari, Sam Rivers, Earth, Max Nagl, David Sylvian ou Lol Coxhill (que também actua nesta edição do OUT.FEST), mas é no seu trabalho a solo que mais gostamos de o encontrar. Opera numa análise e dissecação sobre toda a música, não vendo quebras de pertinência entre a pop, o jazz, as formas livres ou a composição moderna. Nesta actuação vai realizar dois sets, separados por um intervalo: um a partir da sua leitura crua e espectral de canções de Kylie Minogue, Lou Reed, John Fahey, Link Wray ou Nelly Furtado, a editar no seu próximo registo ‘Eagle / Revolver’, e outro baseado nos moldes da sua série obsessiva com som, textura e dinâmica em estado puro, intitulada ‘Joseph’. Imperdível.
video ao vivo http://www.youtube.com/watch?v=PQP_utjOBtc
PANDA BEAR + ONEOHTRIX POINT NEVER
A expectativa e ansiedade em redor do próximo álbum de Panda Bear, ‘Tomboy’ (sucessor do aclamado ‘Person Pitch’) são absolutamente esmagadoras na galáxia independente. No Barreiro, Noah Lennox apresentará o seu alinhamento de novas canções e idiossincráticas interpretações de já clássicos seus e da sua banda Animal Collective. Em real temporada de produção do seu disco actual, o seu padrão de exigência e imperativo identitário de questionar e colocar, renovadamente, a sua música em causa e a forma de a partilhar com o público, revela-se no seu método de teste e avaliação do novo material, por via da sua sucessão de singles que vão saindo – o próximo na Domino, um dos seguintes na Kompakt – e dos concertos seleccionados que vai prestando, como é o caso desta privilegiada apresentação no OUT.FEST.
myspace http://www.myspace.com/pandabear
Qualquer olhar minimamente atento em direcção à música de sintetizadores de derivação do-it-yourself do trabalho dos grandes nomes dos anos 70 (da kösmiche-music alemã ao Vangelis de ‘Albedo 0.39’) e tão propalada nos últimos dois anos, não terá dificuldade em reconhecer o nome de Daniel Lopatin como um dos seus nomes mais essenciais. Entre referências subliminares aos detritos da cultura popular, conceitos pré-cognitivos ou conceptualismo informático sci-fi, Daniel tem vindo, enquanto Oneohtrix Point Never, a trilhar um percurso personalizado coroado com a edição do muito elogiado ‘Rifts’ pela norte-americana No Fun. 'Returnal', já deste ano, é mais um passo em direcção a uma merecida notoriedade de um dos mais importantes arquitectos da música exploratória de carácter sonhador dos tempos vigentes.
site oficial http://www.pointnever.com/
STELLAR OM SOURCE
Projecto nomádico pelos caminhos da terra e da estratosfera da responsabilidade de Christelle Gualdi, ex-arquitecta do conhecido escritório holandês MVRDV e hoje feiticeira de tecnologia electrónica mais e menos antiquada, alicerçada na estética de um novo futurismo plástico do espírito e dos horizontes. Tem editado muito regularmente as suas rápidas evoluções, desde o free-rock do seu extinto duo Mean Motion, ao tribalismo neo-psicadélico dos Way of the Cross (com Dave Nuss, Jan Andrezen e outros) passando para as viagens cósmicas em sintetizadores dos anos 70 já neste projecto, até às suas incursões mais recentes, que pegam o house da Trax dos anos 80, e dão-lhes detalhes e requintes estruturais que só a revisitação posterior a duas décadas poderia permitir. Das mulheres mais marcantes da música independente contemporânea, a menina Gualdi regressa a Portugal num assinalável pico de forma. O concerto é antecedido pela projecção do filme ‘Bénares: Musiques du Ganges’ de Yves Billon.
site oficial http://stellaromsource.com/
TETUZI AKIYAMA + RAFAEL TORAL
Nome inescapável de toda a música de carácter exploratório vinda de um Japão essencial, Tetuzi Akiyama tem vindo a erigir um esplendoroso corpo de obra centrado na guitarra, enquanto veículo para o expressionismo absoluto em toda a sua multiplicidade. Singular de pleno direito, o seu trabalho assenta numa procura transversal de toda e qualquer realidade que o instrumento possa encarnar, da rarefacção zen do quase-silêncio à densidade hipnótica com passagem pelo boogie mais fragmentado, acarretando consigo toda uma herança cujo fantasma primordial ascende até à espiritualidade dos blues mais remotos. Tendo também encetado inúmeras colaborações com gente da maior importância (Keiji Haino, Taku Sugimoto ou Donald McPherson), é pedra basilar para a compreensão das seis cordas, muito para além dos seus trejeitos habituais.
video ao vivo http://www.youtube.com/watch?v=a5IXUZ7O6KI
Nome de referência de toda e qualquer forma musical nascida em Portugal nos últimos vinte anos, Rafael Toral tem vindo a descrever um fascinante percurso rumo à idiossincrasia. Dos seus primeiros trabalhos nos Pop Dell’Arte até ao recente Space Program, Toral tem vindo a pavimentar uma obra única em território ainda por explorar. Reconhecido além fronteiras como um dos nomes mais influentes da contemporaneidade, Rafael Toral é uma peça indispensável na construção do mosaico da música experimental, num reduto único onde as barreiras entre orgânico e electrónico, composição e improviso são constantemente desafiadas. Nesta edição do OUT.FEST, Toral apresentará em estreia uma nova fase do Space Program, acompanhado por Riccardo Dillon Wanke no Fender Rhodes, e Afonso Simões na percussão.
site oficial http://rafaeltoral.net/
EMERALDS + KOSMICDREAM
Vindos da desolação fértil do estado norte-americano do Ohio, os Emeralds têm vindo de modo glorioso a escapar-se com elegância ao nicho dos cdr’s e cassetes que são a norma no subterfúgio norte-americano, para um reconhecimento cada vez mais notório. Constituídos por Steve Hauschildt e John Elliot nos sintetizadores e Mark McGuire na guitarra, este trio parece ser a cristalização de grande parte das explorações sonoras em torno da kösmiche-music levadas a cabo pelos seus pares. De uma incomensurável beleza, as tapeçarias dos Emeralds nunca se apresentam como objectos inacabados ou vestigiais. Antes peças suspensas de um labor e minúcia apaixonantes, num mosaico de linhas de guitarra nostálgicas e teclados infinitos que nunca se retém em fórmulas estanques. São uma das grandes bandas da actualidade, como atesta a recente chegada da banda à editora Mego, editora austríaca de referência na música electrónica e casa de nomes como Fennesz, Radian ou Jim O’Rourke.
video http://www.youtube.com/watch?v=yUPJofuMNtE
Membro dos Tantra, essa instituição lendária do rock progressivo em território nacional, Guilherme da Luz é aquele nome que acaba, inevitavelmente, por ser a ponte directa entre esse legado e a sua passagem para territórios cada vez mais voláteis. Entidade da música de exploração e tons virados para o espaço, muito antes desta ter chegado aos corações de experimentalistas de ética DIY, tem vindo a revelar uma enorme proficuidade de registos em direcção ao infinito. Herdeira da multiplicidade de linguagens cósmicas, a sua música aparece num contínuo sonhador com os grandes da electrónica 70’s alemã, sem nunca se deixar ficar na mera revisão da matéria dada. Um daqueles que sempre esteve por lá, perdido algures em galáxias ainda por cartografar.
myspace www.myspace.com/kosmicdream
RODRIGO AMADO MOTION TRIO + LOL COXHILL + AJM COLLECTIVE
Presença constante, activa e dinamizadora no jazz nacional há mais de 20 anos, Rodrigo Amado é hoje um dos mais pertinentes improvisadores no panorama jazzístico europeu. Em anos recentes tem estado imparável com edições, datas e novos trabalhos, sendo que um dos focos tem sido este excelente Motion Trio com Miguel Mira (violoncelo) e Gabriel Ferrandini (bateria). A secção rítmica brilha, em criatividade e abertura estrutural, com uma métrica seguríssima e livre, mas sempre plena de substância e pertinência. Arquitectura idílica para o saxofone de Amado, que nesta formação prima por fogo, lucidez e placidez. Das formações mais auspiciosas do jazz português, numa confluência de um trio num fantástico momento no que aos seus poderes individuais e colectivos concerne.
site oficial http://www.rodrigoamado.com/
Lowen Coxhill (n.1932, em Portsmouth, Inglaterra) é um saxofonista soprano e sopranino, com uma personalidade e timbre irremediavelmente únicos. Não ‘apesar de’, mas ‘graças a’ ter um domínio técnico e canónico do instrumento aliado a uma intenção e atitude de consecução transversal à música, e à dimensão da expressão humana. Tocou em bandas de suporte a vozes de blues e soul norte-americanas que visitavam a ilha em inícios da década de 60, como Rufus Thomas ou Champion Jack Dupree, fez parte da Kevin Ayers and the Whole World, mas é com o seu primeiro album a solo, ‘Ear of the Beholder’, de 1971, editado pela Dandelion de John Peel, que imprime uma nova direcção para o seu trabalho, construindo um disco para uma audiência rock que insidiou perguntas frescas, numa altura certa. Irá presentear-nos com um dos seus recitais solo, que vem partilhando há décadas de uma forma singular e radical.
video ao vivo http://www.youtube.com/watch?v=eRbQxLQg5FI
Sedeado em Coimbra, este colectivo de formação volátil faz parte de um fervilhar ainda jovem de músicos interessados em desenvolver uma linguagem assente na livre improvisação. Partindo de premissas jazzísticas, resgatam-nas ao cadáver do academismo em busca de uma força anímica pouco interessada na compartimentação estanque, austera. Ainda a maturar de modo saudável, mas com aquela transigência que faz da procura constante um fim em si mesmo, estreiam-se no OUT.FEST devidamente enquadrados com o espírito libertário, retrato de uma nova geração que não procura reunir as pontas soltas que o jazz foi deixando pelo caminho. Antes revesti-las de novos significados.
myspace http://www.myspace.com/ajmcollective
PEDRO SOUSA & GABRIEL FERRANDINI
Duo de gloriosa vitalidade, inteligência, destreza e contemporaneidade, o colossal encontro do saxofone de Pedro Sousa com a bateria Gabriel Ferrandini é dos primeiros milagres da música nacional libertária pós-Fish & Sheep/Loosers/Frango/etc - aquela que se preocupa com várias questões do aqui e agora do rock, do jazz e do que ainda não tem nome nos cruzamentos destas duas escolas (e de tudo o mais importe e que lhes seja primeira e segunda naturezas).
O ponto central é o som - a sua forma, como ataca, mata e faz viver. Os pulmões do Pedro parecem ter sido herdados do soprador mais cáustico que conhecemos - Kaoru Abe. Ele trabalha o som matericamente, dinamicamente - só depois vai buscar a melodia e a frase neo-primitiva (felizmente tem ouvido que se não é absoluto deve andar lá perto). De Gabriel Ferrandini ainda apenas se começou a escrever sobre o impacto que terá na música de cá e de todo sítio. É um baterista verdadeiramente prodigioso técnica, anímica e esteticamente, e dos músicos mais empolgantes que já vimos em palco.
Apanhemos então com estes primeiros momentos públicos, de uma formação de dois rapazes unidos e a encarar a história. Há muito que não era.
myspace http://www.myspace.com/gferrandini
WHITE MAGIC
Projecto criado por Mira Billotte, os novaiorquinos White Magic têm sido das mais fascinantes entidades a trabalhar a forma, a tradição e a progressão da canção anglo-saxónica neste novo século. Parecem preocupar-se com todos os elementos – a métrica das frases, o desenho do ritmo, uma nova reconversão harmónica de elementos vocais e instrumentais, a invenção melódica – das suas construções musicais, numa era em que os aplausos neste formato parecem chegar ao surgimento cada meia ideia, quando não aparecem através uma mimetização estética a que só podemos elogiar o timing.
O seu trajecto público inicia-se com a discreta mas não menos interessante banda Quixotic, que abandona em 2003 para criar os White Magic, que cedo editam dois EP’s marcantes – ‘In Through the Sun Door’ e um outro a meias com o grupo norte-americano American Analog Set. Está logo desde o princípio do seu trabalho editorial a extremamente invulgar cadência das melodias de Billotte, que fazem coabitar a abertura frásica da canção jazz mais simultaneamente livre e objectiva (a Billie Holiday de “Strange Fruit”), a espiral da música etíope de Alemayehu Eshete ou Mahmoud Ahmed, a delicadeza gravitacional de Karen Dalton.
‘Dat Rosa Mel Apibus’, pela Drag City, foi o primeiro registo em longa-duração, e levou este amplo vocabulário para paragens psicadélicas muito próprias, dando mais extensão e invenção de estúdio sem por nunca perder a concisão da música White Magic. Foi já em 2007 que o fenomenal EP ‘Dark Stars’ saiu, contando com a participação e composição decisivas do britânico Doug Shaw, que se manteve hoje como uma espécie de escritor-adjunto do projecto – trouxe à banda mais soltura e um contraste luminoso para toda a densidade enigmática e por vezes turva de Billotte. No mesmo ano, Billote contribuiu para o estrambólico filme ‘I’m Not Here’ de Todd Haynes, com a sua versão do original de Bob Dylan “As I Went Out One Morning”.
2008 viu o lançamento pela Latitudes de uma peça, ‘New Egypt’, versão quase definitiva do formato longo de canção desta primeira fase dos White Magic.
Voltam, neste seu ritmo imprevisível de trabalho público e edições, mas com imparável coerência e inventividade, a lançar um disco de média duração durante este Outono, que deverá ser o centro desta actuação.
Tendo em conta a acústica particular do espaço da Culturgest Porto, com a sua carismática reverberação, a banda aceitou o convite de preparar um alinhamento de canções arranjadas de forma a encaixar nas características sonoras do local. Oportunidade raríssima de observarmos as formas destas canções num contexto mais espectral.
myspace http://www.myspace.com/whitemagicmusic
editora http://www.dragcity.com/
video na Fader TV http://www.thefader.com/2008/11/06/fader-tv-piano-recital-with-mira-billotte-of-white-magic/
vídeo ao vivo no All Tomorrow Parties 2007 http://www.youtube.com/watch?v=53zD75jP9h0&feature
WEYES BLOOD
Projecto de Natalie Mering, que já tivemos a honra de receber na 2ª edição (em 2007) da Avenida, no 211 da Av. da Liberdade.
Durante bastante tempo não soubemos dela nem lhe conhecíamos novidades, mas parece que foi pelas melhores razões. Natalie passou este tempo todo a trabalhar a sério - coisa raríssima na música independente americana dos dias de hoje - em algo de novo e com real propósito.
Com um disco prestes a sair na Not Not Fun, hoje a sua música é uma notável assemblage de voz, colagem pós-concretista de 'found sounds' modificados, teclado/guitarra, e a instrumentação que a própria Natalie constrói, tudo na universal forma da canção. O trabalho de voz anda algures entre os momentos mais iluminados de Buffy Sainte-Marie e o lado de maior hipnose e solenidade de Brigitte Fontaine. O que realmente é avassalador é a narrativa e a estruturação dos temas - a melodia parece infinitamente renovável, e as músicas parece que vão crescendo animicamente e em implosão, como se estivessemos a ver o mais poético dos truques de magia.
Weyes Blood toca no Lounge dias antes (ou depois) do mundo descobrir o trabalho brilhante que para aqui vai. Perder a oportunidade é sacrilégio.
myspace http://www.myspace.com/nataliewiseblood
video ao vivo http://www.youtube.com/watch?v=m3Z4LLRFUo8
EAT SKULL
Agora que a atenção do “underground” vai para a - grosso modo - brutal pasmaceira e repetição mórbida de tudo o que é (muito) vagamente cósmico/nostálgico/hipnagógico (?!) as pessoas dignas que andavam a fazer o que queriam com os estilhaços do rock já podem voltar a existir sossegadas, sabendo que a manada foi para outro sítio. É lá que podemos encontrar os fantásticos Eat Skull, ainda a cavalgar no trabalho do seu segundo e maravilhoso segundo disco pela Siltbreeze, ‘Wild and Inside’. Contando nas suas fileiras com antigos colaboradores da que provavelmente terá sido a maior banda de rock da primeira década do séc. XXI ao lado dos Sightings, os Hospitals, estamos a lidar aqui com verdadeiros cognoscenti de rebaldaria e desassossego. Canções de pop entre os melhores Television Personalities, a cambada dos anos 80 e 90 de barulho e melodia que veio da Nova Zelândia via Flying Nun, e o que parece ser um conhecimento enciclopédico do r’n’roll mais janado produzido desde o dia em que o primeiro bandido com cabelo esquisito pegou numa guitarra eléctrica para rebentar com o cérebro de uma donzela ilegal. Concerto à pala de real desvario num dos santuários para testemunhar esta gama de confusão em Lisboa, o Lounge.
editora http://www.siltbreeze.com/
"Oregon Dreaming" http://www.youtube.com/watch?v=rHwVfmdHZz4
video para "Don't Leave me on the Speaker" http://www.youtube.com/watch?v=Xh-dEMtyUO4
video ao vivo http://www.youtube.com/watch?v=3yHfeaQGHZg&feature
WHITE MAGIC + NORBERTO LOBO
Projecto criado por Mira Billotte, os novaiorquinos White Magic têm sido das mais fascinantes entidades a trabalhar a forma, a tradição e a progressão da canção anglo-saxónica neste novo século. Parecem preocupar-se com todos os elementos – a métrica das frases, o desenho do ritmo, uma nova reconversão harmónica de elementos vocais e instrumentais, a invenção melódica – das suas construções musicais, numa era em que os aplausos neste formato parecem chegar ao surgimento cada meia ideia, quando não aparecem através uma mimetização estética a que só podemos elogiar o timing.
O seu trajecto público inicia-se com a discreta mas não menos interessante banda Quixotic, que abandona em 2003 para criar os White Magic, que cedo editam dois EP’s marcantes – ‘In Through the Sun Door’ e um outro a meias com o grupo norte-americano American Analog Set. Está logo desde o princípio do seu trabalho editorial a extremamente invulgar cadência das melodias de Billotte, que fazem coabitar a abertura frásica da canção jazz mais simultaneamente livre e objectiva (a Billie Holiday de “Strange Fruit”), a espiral da música etíope de Alemayehu Eshete ou Mahmoud Ahmed, a delicadeza gravitacional de Karen Dalton.
‘Dat Rosa Mel Apibus’, pela Drag City, foi o primeiro registo em longa-duração, e levou este amplo vocabulário para paragens psicadélicas muito próprias, dando mais extensão e invenção de estúdio sem por nunca perder a concisão da música White Magic. Foi já em 2007 que o fenomenal EP ‘Dark Stars’ saiu, contando com a participação e composição decisivas do britânico Doug Shaw, que se manteve hoje como uma espécie de escritor-adjunto do projecto – trouxe à banda mais soltura e um contraste luminoso para toda a densidade enigmática e por vezes turva de Billotte. No mesmo ano, Billote contribuiu para o estrambólico filme ‘I’m Not Here’ de Todd Haynes, com a sua versão do original de Bob Dylan “As I Went Out One Morning”.
2008 viu o lançamento pela Latitudes de uma peça, ‘New Egypt’, versão quase definitiva do formato longo de canção desta primeira fase dos White Magic.
Voltam, neste seu ritmo imprevisível de trabalho público e edições, mas com imparável coerência e inventividade, a lançar um disco de média duração durante este Outono, que deverá ser o centro desta actuação.
Tendo em conta a acústica particular do espaço da Culturgest Porto, com a sua carismática reverberação, a banda aceitou o convite de preparar um alinhamento de canções arranjadas de forma a encaixar nas características sonoras do local. Oportunidade raríssima de observarmos as formas destas canções num contexto mais espectral.
Para a actuação de Lisboa, que terá lugar no lindíssimo e amplo sotão da loja mais recente de Lidija Kolovrat, no nº 79 da R. D. Pedro V, haverá também um concerto do fantástico Norberto Lobo a abrir a noite, e a mostrar-nos como vão os avanços nas novas composições para o seu aguardado 3º álbum de longa duração. O Norberto acaba de chegar de uma digressão de dez datas pelo Japão que, ao que parece, correu lindamente (como sempre, com ele).
myspace http://www.myspace.com/whitemagicmusic
editora http://www.dragcity.com/
video na Fader Tv http://www.thefader.com/2008/11/06/fader-tv-piano-recital-with-mira-billotte-of-white-magic/
video ao vivo http://www.youtube.com/watch?v=53zD75jP9h0&feature
DANIEL CARTER, WILLIAM PARKER & FEDERICO UGHI
Trio de músicos sediados em Nova Iorque que se dedica a uma improvisação alicerçada no território do jazz.
‘The Dream’ (2006, 577 Records) foi o primeiro disco que os reuniu e evidenciou o superior nível de comunicação em que o grupo navega. Com uma dinâmica de colectivo fluída e pujante, e assente numa congruência admirável de dinâmicas e registos ao longo do disco, a música produzida por este trio partilha sem sobranceria História decantada para a contemporaneidade.
O álbum expõe Carter a tocar piano pela primeira vez, num estilo reminiscente do incontornável Cecil Taylor ou de Dave Burrell, para além de contribuir com o seu querido arsenal de sopros: trompete, flauta, clarinete e saxofones alto e tenor. Quanto a Parker escutamo-lo a espraiar-se em incantações amplas em tuba, para além da sua reconhecível identidade no contrabaixo. Ughi, por seu lado, afirma-se como um baterista com níveis de energia evocatórias de um Rashied Ali, do período ‘Interstellar Space’ de Coltrane.
Daniel Carter, que iniciou a sua actividade pública em Nova Iorque no início dos anos 70, é um exímio soprador de fogo, tendo tocado e gravado com gente como Thurston Moore, Anti-Pop Consortium, Yo La Tengo ou Plastic Ono Band de Yoko Ono. William Parker dispensa apresentações, iniciou o seu percurso público no milieu free com gigantes como Bill Dixon, Don Cherry ou Sunny Murray, tendo depois integrado a Cecil Taylor Unit de 1980 a 1991 e encetado uma relação duradoura de colaboração com pares europeus como Peter Brötzmann, Louis Sclavis ou Derek Bailey. É também um reverenciado teórico e autor com obra publicada, tendo também sido professor universitário em várias instituições. Ughi, italiano radicado em Brooklyn, é reconhecido pela sua pertinência melódica em percussão, abrindo espaço harmónico e métrico ricos para as formações que com ele contam.
site oficial http://www.williamparker.net/
myspace http://www.myspace.com/musicartscienceliterature
site oficial http://www.federicoughi.com/
entrevista a Daniel Carter na All About Jazzhttp://www.allaboutjazz.com/iviews/dcarter.htm
entrevista a William Parker na Jazz Weekly http://www.targetnet.com/?redir=frame&uid=www507d6c69e40186.19557059